As pessoas não têm tempo!... A coisa mais difícil é achar alguém com disponibilidade para ouvir o outro... Mais lamentável, ainda, é que não arranjam tempo nem para ouvirem elas próprias!... Levam a vida cumprindo tarefas, no modo automático acelerado...
Assim como necessitamos ingerir bons nutrientes para garantirmos a nossa saúde e o perfeito funcionamento do nosso organismo, da mesma forma, precisamos alimentar os nossos pensamentos com leituras que levem a reflexões construtivas...
MORAR BEM
Morar bem pra mim não é só viver num bom imóvel em local privilegiado. Posso lhes dizer que o meu sonho vai muito mais além... É que estou me referindo ao desejo de uma construção interna, que tem começo, mas não tem fim... Aquela que está sempre sujeita a obras intermináveis aqui e ali: demolição de paredes inúteis, necessidade de constante troca de tijolos, colocação de piso mais seguro, substituição de vidros que há muito perderam a sua transparência e andam dificultando a nossa visão das coisas... E o lixo acumulado?... Como é custoso desapegarmos de nossos preconceitos e, também, das mágoas e ressentimentos, que só servem para nos confundir e nos atrapalhar a vida! Ah!... Como essa obra é complicada!... Mas, o quanto antes, temos de criar coragem para enfrentá-la: precisamos morar bem dentro de nós mesmos!...
Que Deus me ajude a persistir nessa empreitada! Preciso dar continuidade à construção de um lar aconchegante dentro do meu espaço interno, capaz de acolher com amor e generosidade a mim e a todos que vierem me visitar...
Ana Abreu – 26/06/2015
O OLHAR
Nenhuma fala consegue ser tão eloquente quanto o olhar (ou o não-olhar). Seu entendimento é infalível!... Utiliza linguagem própria, silenciosa... E barra as palavras com o seu poder de penetrar na alma do outro!...
Sou de uma geração em que as famílias eram numerosas e, provavelmente, por isso tenha percebido tão claramente que, por mais que os pais tentassem disfarçar, o amor talvez não mas, o olhar para cada filho era diferenciado. A chegada do primeiro filho era a grande chance do casal realizar seus sonhos frustrados, através de uma projeção legitimada culturalmente... O primogênito era visto como uma preciosidade (“Que beleza!” “Como é inteligente!” “Quanta vivacidade!...”). Via de regra com o mesmo nome do pai ou do avô, já nascia com um lugar bem definido no desejo destes e até a sua profissão, muitas vezes, desde então estava escolhida... Não nos cabe aqui considerar se tamanha ansiedade em relação ao seu futuro, muitas vezes, também, não lhe era incômoda, tendo em vista a cobrança e a responsabilidade que lhe eram impostas desde cedo. Mas, sem dúvida, o brilho no olhar dos familiares, carregado de encantamento e certeza do seu sucesso, servia-lhe de mola propulsora para o incremento de suas potencialidades!...
Em outras situações o olhar pode ser altamente revelador. Quando a gente é apresentado a alguém, por exemplo, na primeira troca de olhares, a gente já sente interesse, ou não, por aquela relação. E... Quando o “santo” não combina... Fica complicado!... Por mais que haja esforço, tudo soa falso, a espontaneidade vai embora, nada flui, as palavras emperram, e as poucas que conseguimos emitir, não raro, “azedam” na cabeça do outro, mesmo que a nossa intenção não tenha sido essa... Em contrapartida, há pessoas que a gente já gosta de graça, à primeira vista!... Neste caso, em geral, os olhares transmitem uma confiança mútua, o que torna o encontro promissor para as duas partes. A propósito, duas irmãs, certa vez, falavam dos seus pais e até parecia que se referiam a pessoas diferentes... Cada qual com o seu olhar, imprimia a sua verdade, atribuindo-lhes, curiosamente, características de pessoas completamente distintas!...
Embora palavras de amor e carinho sejam sempre bem vindas e soem como bela sinfonia aos nossos ouvidos, na verdade, o que a gente precisa mesmo é do olhar amigo, confiante, aquele que nos apoia, fortalece, e nos incentiva a buscar o melhor de nós mesmos!...
Ana Abreu - 12/07/15
SINAL DOS TEMPOS...
De uns tempos pra cá, a disparada do progresso tecnológico tem trazido tantas e tão marcantes mudanças à nossa vida, que fica difícil, de vez em quando, a gente não se pegar meio nostálgica...
Nossa casa costumava ser palco de uma vida familiar alegre, compartilhada... Todos reunidos em volta da mesa, contávamos nossos “casos” do dia a dia, enriquecendo sobremaneira a hora do almoço e do jantar... Televisão? Uma só, na sala, e todos espremidinhos no sofá... Era uma verdadeira curtição!... O telefone, também, era instalado um único aparelho no centro da casa, para uso de todos...
E a casa cheia da vovó aos domingos? Sem dúvida: um programão!... Nada melhor!... Lá encontrávamos com os primos, ficávamos “por dentro” das últimas novidades da família e nos deliciávamos com os quitutes daquela casa que cheirava brigadeiro... Mesa farta!... Ninguém falava em gorduras trans... Nem em glúten e lactose!... Era só prazer! Nada dava trabalho, nem pesava no bolso... Mesmo porque, naquela época, o encontro da família era tudo, e justificava qualquer esforço!...
Mas, aos poucos, fomos mudando a nossa cabeça e os nossos hábitos... E a gente nem imaginava aonde em pouco tempo iríamos chegar!... A começar pelos aparelhos de TV nos quartos... Em seguida, as extensões telefônicas em vários pontos da casa... Fomos ficando cada vez mais comodistas, e desejosos de privacidade!... E cada qual com o seu controle remoto na mão, fomos construindo nossos pequenos “muros” dentro de casa... Depois, para completar, levamos também o computador e o telefone celular, não só para dentro do quarto, mas para nos acompanhar em todos os momentos do dia... E, ainda, nos finais de semana, as sedutoras luzes dos shoppings foram ficando, sem dúvida, mais atraentes aos olhos da meninada do que as da casa da vovó...
Hoje, a situação é a seguinte: já não estamos mais interessados em investir em vida familiar, nem em receber amigos em casa... Ouvi-los, nem pelo telefone!... Não temos mais tempo para isso! É preferível “fazer amizade” com as máquinas... É muito mais prático: estão sempre à nossa disposição, não nos pedem nada, nem nos cobram coisa alguma... E jamais irão nos incomodar fora de hora!... Com isso, lamentavelmente, estamos ficando cada vez mais egoístas e intolerantes nos nossos relacionamentos interpessoais. Nosso lema é: quem “encher o saco”, será deletado da minha lista de contatos!... E pronto! Está resolvido! Simples assim!...
Estamos num mundo em que cada um constrói um “império”exclusivo dentro do seu quarto!... E a opção pela convivência com as máquinas passou a ser o sonho de consumo de um crescente número de pessoas, que alimentam um pensamento deveras preocupante: “investir em relações humanas pra quê, se eu já tenho o mundo nas mãos dentro do meu próprio quarto?...”
Ana Abreu - 26 / 07 / 2015
NENHUM DE NÓS É UMA UNANIMIDADE !...
Nada consegue ser tão doloroso quanto o amor não correspondido... Não estou me referindo só ao amor romântico... Mas, a todas as formas desse sentimento, nas suas diversas esferas e nos diferentes níveis...
A necessidade de aceitação e de acolhimento é inerente ao ser humano. E não adianta querermos negar isso... Até quando entramos num salão para fazer as unhas, ou numa loja para comprar algo, esperamos, pelo menos, um sorriso receptivo do profissional que vai nos atender e, quando isso não acontece, a gente se sente mal, um tanto incomodado... Nessas horas, a nossa autoestima cai, despenca lá pros pés!... Por uns momentos, nos sentimos inoportunos, e até rejeitados... Em reuniões sociais, também, como é
desconcertante tentarmos conversar com alguém que insiste em fazer “cara de paisagem”, fingindo não ouvir as nossas colocações, simplesmente não nos dirigindo o olhar, nem a palavra!... Como é duro percebermos o “tilintar da ficha caindo”, revelando que essa tal pessoa não quer papo com a gente!... E quando se trata de um relacionamento que envolve conquista amorosa, então, nem se fala!... O sofrimento é, no mínimo, elevado ao cubo!...
Todos nós já passamos por isso... Mas é bom que se saiba que, na maioria das vezes, isso não tem a ver só com o "aqui e agora"; pode estar associado a conteúdos inconscientes: sem nos darmos conta, tendemos a rejeitar alguém que tem alguma característica que não nos agrada em nós mesmos ou, então, que adoraríamos ter, e não conseguimos... Assim, os alegres, falantes ou extrovertidos, estarão sempre correndo o risco de serem vistos como “exibidos”, principalmente por aqueles que têm dificuldade de se expressar em público; e os mais calados, tímidos ou introvertidos, de serem tachados de esnobes ou antipáticos... Outras vezes, o que pode pesar é alguma semelhança com alguém que a gente não gosta... Simplesmente um traço físico ou, até mesmo, o tom de voz da outra pessoa pode ser o suficiente para resgatar uma má lembrança e gerar em nós, automaticamente, uma antipatia ou, até mesmo, uma aversão... Enfim, as possibilidades são muitas e não se esgotam aqui...
Além disso, não podemos deixar de considerar as diferenças individuais!... E de respeitar o direito de cada um fazer escolhas de acordo com os seus gostos, preferências e afinidades!...
Ana Abreu - 1º / 08 /15
JUNTOS NÃO MAIS NOS SOMAMOS
A generosidade, a solidariedade e o apoio mútuos são bens inestimáveis e seria bom que estivessem presentes em todas as relações românticas ou de amizade. Até a pouco tempo atrás, chegava-se até ao exagero de se acreditar que o casamento juntaria duas metades... Pairava no inconsciente coletivo a ideia de que uma pessoa sozinha seria menos... E teria de buscar numa outra pessoa a sua completude, a sua felicidade...
Hoje, uma parceria construtiva está se tornando cada vez mais difícil... A ideologia do compromisso com o sucesso, a qualquer preço, gerou um desagradável clima de competição, inclusive entre os casais... Já não nos satisfaz sermos bons, temos que ser os melhores em tudo!... No trabalho, no esporte, nas nossas relações, inclusive conjugais... Acabamos com o diálogo, com a simples troca de pontos de vista e com o respeito pela opinião do outro... Meus argumentos precisam ser bombásticos o suficiente para calar o outro, pois não quero perder tempo ouvindo suas ideias... Todo mundo quer dar a última palavra!... Não podemos admitir fraquezas, nem limitações... Em nós e, muito menos, nos outros... Estamos nos tornando cada dia mais arrogantes e intolerantes!... E reféns de um tempo curto, que tem que dar pra tudo que a vida atual nos impõe!...
Juntos, não mais nos somamos... E, não raro, até subtraímos virtudes, um do outro... Particularmente, penso que as relações deveriam servir para fomentar o crescimento individual, fornecendo apoio e condições emocionais necessárias para cada um realizar o seu melhor. Há pessoas tão elegantes no comportamento, que nos induzem a adotar uma atitude semelhante em relação a elas!... Mas, lamentavelmente, nem sempre isso acontece... Não posso ser sempre gentil, como gostaria, pois tenho que me proteger dos eventuais aproveitadores... Às vezes, até contra meus princípios, me pego sendo pouco generosa, diante dessas pessoas mesquinhas, que pensam tão pequeno. E como isso me aborrece!...
Enfim, cada um de nós vive focado no seu próprio brilho e nas coisas que lhe dão prazer e, portanto, anda insensível às necessidades de quem está a seu lado... Vemos muito pouco interesse em investimento nas relações, que andam bem fragilizadas!... Aliás, preocupam-me os idosos, nesse mundo tão inóspito. A medicina aumentou-lhes a expectativa de vida e, no entanto, seus filhos não têm tempo... As pessoas não os enxergam... Os jovens não os ouvem... E a vida tem pressa... muita pressa!...
Outro dia, numa entrevista, ouvi alguém dizendo: “Estamos comprando pessoas e amando coisas!...” Triste, mas é verdade!...
Ana Abreu – 19/08/2015
PEQUENOS PRAZERES DOMÉSTICOS
Tem gente que não gosta de rotina; eu, particularmente, adoro a minha! É que, ao longo do tempo, fui me tornando uma verdadeira especialista em enriquecer o meu dia-a-dia, descobrindo mil coisas que estavam ao meu alcance e que poderiam agregar mais prazer e alegria ao meu cotidiano... Saquei que “deixar a vida me levar”, acomodada, sem “correr atrás” do que me faz feliz - sempre na dependência de ter alguma companhia pra fazer algo ou esperando por momentos espetaculares - não seria o melhor caminho para a minha satisfação pessoal, até porque ocasiões tão especiais não surgem a toda hora pra todo mundo!... E, enquanto isso, a vida está correndo, acontecendo a cada segundo... E numa velocidade deveras assustadora! Quem já passou dos 40 sabe muito bem disso!...
A primeira providência foi mergulhar para dentro de mim mesma pra tentar me descobrir ao máximo. Enquanto a gente não se conhece suficientemente, a gente fica perdida, sem saber buscar o que vai nos preencher internamente. E eu nunca tinha parado pra pensar nas milhares de opções que dispunha, capazes de me gratificar como pessoa... E também não imaginava que pudesse vir a gostar tanto da minha própria companhia!... Que descoberta!
Aprendi a manter meu coração aberto e a deixar-me encantar pela beleza de coisas aparentementente muito simples, mas que acabam fazendo toda a diferença!... Quantas vezes, morando no Rio, passava pela praia sem sequer me lembrar de olhar o mar?...
Não sou do tipo que se liga no automático e vai, rapidinho, cumprindo tarefas... É claro que, muitas vezes, a correria da vida atual nos impõe certa agilidade e rapidez... Mas, sempre que possível, tenho procurado descobrir qual o horário mais adequado para cada um dos meus afazeres ou atividades, pra evitar ter que me submeter a grandes sacrifícios em horas desconfortáveis para mim... Por exemplo: pela manhã sinto-me com maior disposição, mais animada para executar tarefas menos atraentes... Assim sendo, os meus exercícios físicos ficaram pra mais tarde.... É que, embora goste muito de cozinhar, quando chego em casa , preciso encontrar na geladeira a minha salada previamente preparada senão, cansada e com fome, eu acabo não tendo ânimo para lavar, picar e cozinhar legumes e verduras... E, cá pra nós, também, não é a qualquer hora que eu curto descascar cebolas...
Amo a minha casa e as minhas coisas – aprendi a dar mais valor ao que tenho!... Gosto muito de ouvir música, e de ter flores nos banheiros, na cozinha, nos quatro cantos da casa... Estou sempre substituindo os vasinhos pois, quando floridos, me transmitem muita alegria!...
Costumo chamar minha casa de “Terra Encantada”, tendo em vista o quanto de divertimento ela é capaz de me proporcionar!... Acredito que, embora seja muito bom sair, combinar altas programações com amigos, a gente não precisa estar fora de casa, nem mesmo acompanhada o tempo todo para ser feliz... Que a gente pode curtir muito também estar em casa, sozinha, quando então temos liberdade para fazer o que desejamos, sem a preocupação de ter que agradar aos outros... Assim, nesses momentos, sei apreciar atividades como ler, escrever, pintar, criar ou consertar algo, ouvir música, costurar, bordar, cuidar de plantas, ver programas especiais na TV, acessar a internet, fazer uma comidinha especial, ou, ainda, assistir a um belo filme ou a uma boa entrevista. A propósito, em relação a esta última, costumo encarar como se estivesse recebendo aquela(s) visita(s) em minha casa... E, diga-se de passagem, nem sempre as nossas visitas são capazes de nos acrescentar tanto!... E, além disso, raramente elas conseguem nos fazer tanta companhia!...
Ana Abreu – 10/10/2015